sexta-feira, 20 de março de 2009

Saber subterrâneo


REVISTA NOVA ESCOLA.
No seu tempo de escola, qual estratégia o professor de Geografia usava para explicar conteúdos como os tipos de solo? Provavelmente, ele fazia isso por meio da memorização: latossolo, argissolo e cambissolo. A mesma tática servia para descrever rios, tipos de floresta e outros aspectos da paisagem. Antes de atirar pedras no seu antigo mestre, é bom lembrar que até a década de 1960 o ensino da disciplina esteve dominado pela metodologia tradicional, centrada na descrição e na memorização. O problema é que essa abordagem deixava de fora coisas demais, especialmente os processos da natureza e as modificações introduzidas pela ação do homem.
No exemplo dos tipos de solo, não se estabeleciam conexões entre a lista a ser memorizada e os fenômenos que originaram a camada mais superficial da crosta terrestre - o chamado intemperismo, conjunto de fenômenos que inclui o desgaste causado pela ação da chuva e do vento (conheça as principais etapas da transformação no infográfico "Como a pedra vira terra - e o que fazemos com ela"). Também não se mostrava de que forma os usos que diferentes grupos fazem do terreno podem mudar seu curso natural - como a agricultura intensiva leva à erosão e o desmatamento causa a desertificação. Em outras palavras, a abordagem estática e descontextualizada escondia a noção de processo: uma seqüência de estados de um sistema que se transforma, algo essencial para a concepção de espaço como um elemento dinâmico da realidade.
Essa capacidade de inter-relacionar fenômenos aparentemente desconectados deve ser uma das metas para que o conhecimento seja significativo. "No caso das variedades de solo, é preciso mostrar a rede de processos interligados desde a transformação das rochas até a exploração econômica dos terrenos", diz Sueli Furlan, professora de Geografia da Universidade de São Paulo e selecionadora do Prêmio Victor Civita Educador Nota 10. Melhor ainda se a proposta incluir elementos do cotidiano: isso abre espaço para saídas a campo em que os alunos desenvolvam procedimentos como levantamento de hipóteses, coleta de dados e relatórios que comparem o que foi observado com as informações do livro. Leonardo Bez, da EBM Professor Manoel Roldão das Neves, em Biguaçu, a 19 quilômetros de Florianópolis, apostou nessa perspectiva para explicar a formação e o uso dos solos às turmas de 5ª série . Ele começou o trabalho na sala de aula lançando perguntas sobre o tema:
O que é solo?- É terra. Ele é feito de terra - arriscou um dos meninos.- Além de terra, tem areia. E existem uns bichinhos que moram lá - completou uma colega.
- E o que tem debaixo dele? - Pedras! - responderam em coro.- Certo. Mas como uma rocha tão dura pode ser transformada em solo?- Ué... Acho que a água vai amolecendo a rocha e virando solo.Para que a curiosidade sobre o assunto e as hipóteses se tornassem aprendizagem, Bez organizou diversas etapas de estudo. A primeira foram as aulas expositivas, em que ilustrações e mapas foram aliados importantes na compreensão. Com a ajuda deles, os estudantes aprenderam as características das rochas metamórficas, ígneas e sedimentares, viram em quais locais cada uma delas aparece e aprenderam que as alterações causadas pelo intemperismo e pela erosão formam os solos. Por meio dos cortes no terreno, a garotada entendeu que os solos são dispostos em camadas, chamadas de horizontes, cada um com cor, textura e consistência diferentes. "Com isso, ficou fácil para a turma finalmente compreender de verdade a lista dos tipos de solo que tínhamos de decorar em nosso tempo de escola", diverte-se o professor.

BIBLIOGRAFIA Formação e Conservação dos Solos, Igo F. Lepsch, 192 págs., Ed. Oficina de Textos, tel. (11) 3085-7933, 58 reaisSolos e Meio Ambiente: Abordagem para Professores do Ensino Fundamental e Médio, Valmiqui Costa Lima e outros, 130 págs., Ed. Departamento de Solos e Engenharia Agrícola da Universidade Federal do Paraná, tel. (41) 3350-5649,

Nenhum comentário:

Postar um comentário